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DA LAVOURA À SALA DE AULA: COMO O PROGRAMA “CONHECENDO O AGRO” SEMEIA O FUTURO EM ESCOLAS NO OESTE DA BAHIA


Criada em 2019, a iniciativa da ABAPA visa conectar professores e alunos das redes pública e privada de ensino ao universo da produção agrícola, com um foco na cultura do algodão.

Por Luis Brandão | Estudante de Jornalismo UNIFAT

As longas distâncias para a capital e o acentuado clima semiárido não foram questões que impediram um espírito de progresso, disposto a predominar nas margens do nordeste brasileiro. Com a chegada dos primeiros imigrantes, vindos do Sul e Sudeste do país, ainda no início dos anos 1980, o Oeste da Bahia passou a colher os primeiros frutos de famílias e grupos empreendedores, que, através da agricultura, olharam com confiança para essa região e investiram alto para o desenvolvimento econômico, social e cultural dessa terra. 

Desde então, os indicadores dessa região no cerrado acumulam números em constante ascensão. De acordo com a Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), o ano de 2023 fechou com um crescimento exponencial e as expectativas para este ano também são promissoras para o oeste do estado. Em outras palavras, o sucesso desses balanços pode ser explicado pelos reflexos do agronegócio e o impacto positivo que esse ramo proporciona dentro e fora das lavouras. 

Dominando o segmento agrícola em diferentes cenários há décadas, a região oeste da Bahia segue em destaque na produção de grãos, mas é através do algodão que a agricultura baiana alcança a posição de referência, tanto na produção estadual como no montante nacional. Para o economista Jeferson Araújo, da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), a dinâmica econômica dessa região é baseada em altos investimentos financeiros, no rigoroso aperfeiçoamento técnico, no fomento às exportações e na qualidade das safras.

Algodoeira na Fazenda Santa Isabel, em LEM. Imagens: Luis Brandão, 2024 

Para ele, os bons índices da agricultura abrem brechas para outras questões, como a importância de pensar sobre as pessoas que estão por trás dos números. “Devido o manejo com o algodão, o oeste passou a ser considerado um polo de geração de emprego, porque atrai investidores de outras partes do país, tanto é que isso ajuda a explicar o fenômeno do crescimento da própria população local. Quanto mais oportunidades, maior é a chegada de migrantes, e isso também está associada à urgência da profissionalização e formação delas”, pontua Araújo. 

É desse lugar que partimos, e é em busca de histórias de justifiquem essa realidade, que o município de Luis Eduardo Magalhães passa ser o cenário ideal para entender como os avanços do presente constroem, cotidianamente, o futuro da região. Dessa forma, reconhecer o papel da educação como um instrumento de transformação social foi, de imediato, uma das primeiras apostas da Associação Baiana dos Produtores de Algodão – ABAPA, para que as novas gerações passem a assumir o protagonismo do desenvolvimento local. 

Foi assim, entre o desejo de disseminar a agricultura e a necessidade de garantir o amanhã, que a ABAPA saiu na frente, com a criação de um programa educacional inovador, visionário e pioneiro: o “Conhecendo o Agro”. Fundada em 2019, a iniciativa visa conectar professores e estudantes das redes pública e privada de ensino ao universo da produção agrícola, com um foco na cultura do algodão, construindo e, principalmente, criando condições pedagógicas para que a escola seja um espaço fértil para o sucesso do setor e para a formação dos discentes. 

Quanto à metodologia, o programa procura associar os saberes teóricos à vivência das práticas. Em linhas gerais, o “Conhecendo o Agro” proporciona visitas guiadas em fazendas e agroindústrias da região, oferecendo um conteúdo exclusivo criado a partir de recursos metodológicos próprios do programa, sendo transmitido por meio de capacitações, workshops e outras abordagens pedagógicas. Nas salas de aula, os professores são habilitados para desenvolver os saberes do campo em todos os componentes curriculares, estimulando os estudantes de modo dinâmico e transversal.

Em cinco anos de criação, o programa é falado com orgulho e, principalmente, otimismo por quem esteve de perto, acompanhando o passo a passo da iniciativa. Para Luiz Carlos Bergamaschi, presidente da ABAPA, os conhecimentos gerados sobre a atividade agrícola e a importância dela para o meio ambiente e sociedade são essenciais para a manutenção do programa. “Acredito que o conhecimento seja sempre a chave para o futuro promissor das pessoas. E é por isso que a nossa associação apoia os estudos e encoraja esses estudantes a se tornarem líderes e, sobretudo, bons profissionais”, completou o dirigente. 

Luiz Carlos Bergamaschi fala com estudantes de jornalismo sobre as ações da ABAPA. Imagens: Luis Brandão, 2024 

Gustavo Prado, diretor-executivo da ABAPA, assegura que o “Conhecendo o Agro” contribui não só para a formação dos estudantes, mas também para o desenvolvimento de todo um setor. Ele enfatiza ainda que, através do apoio às escolas públicas e privadas do oeste, a associação participa ativamente do processo de projeção social dos futuros trabalhadores. “O programa forma sucessores, emergindo esses nossos estudantes na cultura do algodão e permitindo com que eles desenvolvam tecnologia e inovação, através, inclusive, da própria inteligência artificial e outras ferramentas digitais”, destaca. 

O entusiasmo das palavras de Bergamaschi e Prado se revela na grande adesão que o programa conquistou no oeste do estado, ao longo dos últimos anos. De acordo com os dados referentes a 2024, mais 14,5 mil estudantes estão matriculados nas atividades ofertadas pelo “Conhecendo o Agro”, em, pelo menos, 11 municípios da região. Ao todo, 700 professores foram capacitados pelo projeto da ABAPA e, agora, estão empenhados para trabalhar a cotonicultura, as práticas agrícolas sustentáveis, inovações tecnológicas e a atuação socioambiental, nas salas de aula de 87 instituições escolares. 

Além da grande participação do setor educacional da região, outro fator que chama atenção é o fato do “Conhecendo o Agro” servir como um claro exemplo para entender que, através do chão da escola, basta a iniciativa de lançar sobre ele as boas sementes para que as boas safras sejam garantidas. O programa foi aprovado pelo professor doutor em Educação do Campo, Charles Maycon Mota, da UEFS, que, ao analisar as propostas 

pedagógicas, ressaltou que os objetivos e os resultados obtidos pelo programa se alinham com o desejo coletivo de desenvolvimento social e formação humana. 

O especialista reforça que o papel da escola no desenvolvimento social de uma região, em que as atividades agrícolas potencializam a economia local, é fundamental e multifacetado. Pensando nisso, Mota pontou alguns fatores que explicam a atuação dessas escolas dentro do contexto do oeste da Bahia. “É bacana nós entendermos que a escola proporciona aos estudantes os conhecimentos básicos e as habilidades, que são essenciais para o crescimento individual e comunitário, o que ajuda a qualificar a mão de obra local para atividades rurais e outras áreas”, ressaltou, ao defender os benefícios do programa para a qualificação profissional dos envolvidos. 

Questionado sobre a responsabilidade que o programa assume com a sociedade, Mota diz ainda que, ao garantir o acesso à educação, as escolas, adeptas ao “Conhecendo o Agro”, promovem a inclusão social, diminuindo a desigualdade e criando oportunidades. O professor não se hesita ao afirmar que, ao preparar os estudantes para o mercado de trabalho e para o empreendedorismo, a escola contribui para a diversificação da própria economia local, levando à inovação no setor agropecuário ou até mesmo à criação de novos negócios e o surgimento de cooperativas. 

Da lavoura à sala de aula, o programa “Conhecendo o Agro” segue firme, com expectativas altas para a colheita das primeiras gerações. A partir dessa iniciativa da ABAPA, o oeste da Bahia nutre a certeza de que a parceria entre educação e agricultura será sempre vindoura, uma vez que ela promove a construção de identidade desses futuros profissionais do campo e preserva as tradições, saberes e memórias das comunidades rurais. Por fim, ao mesmo tempo em que expande os horizontes dos estudantes, o programa se encarrega do dever de formar sujeitos comprometidos com o progresso de todo o Brasil. 

Na fazenda Santa Isabel, a colheita do algodão transforma o espaço. Imagens: Emanuel Peixoto, 2024