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Novembro Negro: a origem da data e o impacto nos dias atuais em Feira de Santana

Dia 20 de novembro é o Dia da Consciência Negra e Dia Nacional de Zumbi. No Brasil, a data foi instituída como feriado nacional desde 2024 por meio da Lei nº 14.759/2023. Se celebra em homenagem à memória de Zumbi dos Palmares, figura histórica na luta negra no país e líder do Quilombo dos Palmares, considerado o maior quilombo que já existiu no território brasileiro. Zumbi faleceu no dia 20 de novembro de 1695 após mais um dos diversos ataques de tropas portuguesas na tentativa de destruir o quilombo. O Novembro Negro é, sobretudo, um mês de combate, reflexão e conscientização acerca do racismo.

Segundo o historiador Vitor Gabriel Nunes, a história do Novembro Negro é extensa e a sua importância muitas vezes é silenciada. Em sua pesquisa intitulada “Um educador para seu povo: Daniel Alexander Payne e a African Methodist Episcopal Church nos Estados Unidos (1811–1893)”.

Vitor em apresentação da sua pesquisa. Foto: Tohn Moreira

Vitor cita a autonomia negra. “O regime escravista estadunidense gerou e difundiu a ideia de um escravizado dependente e submisso, que não poderia se autogovernar e autogerir, e a A.m.e prova justamente o contrário. Seus membros lutaram por emancipação, e no pós-emancipação lutaram por cidadania e plenitude de direitos”. A pesquisa do historiador surgiu do interesse em analisar interpretações e leituras de afroamericanos livres e escravizados acerca da religiosidade Metodista, abordando a emancipação dos escravizados e nas lutas por cidadania.

Vitor com orientadores da pesquisa durante apresentação. Foto: Tohn Moreira

A ideia de liberdade é vivida pela população preta no mundo e com ela a conquista de direitos, como poder estudar e se formar no ensino superior. A estudante de Engenharia Josi Santa Barbara relata os desafios da graduação sendo uma jovem negra. “No meu primeiro semestre cursando Engenharia de Tecnologia Assistiva e Acessibilidade, por exemplo, tive a matéria Diversidade, Cultura e Relações Étnico-raciais. Fiquei super empolgada, mas logo me vi decepcionada ao perceber que a professora era uma mulher branca, de olhos verdes, e isso quebrou um pouco a expectativa de me ver refletida naquele espaço. Ainda nesse primeiro semestre, fui humilhada por uma professora na frente da turma”.

Foto: Reprodução/Instagram

Situações como essa não são isoladas. Os desafios de estudantes pretos após ingressarem no ensino superior são inúmeros, inclusive a comparação incessante com outros alunos. “E, pra ser sincera, tem momentos em que sinto que preciso ser três vezes melhor para receber algum tipo de validação, como se o básico nunca fosse suficiente quando se é uma pessoa negra”, relata Josi.

Campanhas como o Novembro Negro reforçam a necessidade de valorização e acolhimento de pretos e pardos e a cultura negra na sociedade. Dentro e fora do ambiente acadêmico, ações, movimentos e eventos de reafirmação da identidade negra no Brasil acontecem em todo o país, como o Afro Potência, projeto coordenado pelo estudante de psicologia Samuel Ferreira. “O projeto emerge da escuta e da vivência direta com jovens negros e negras que sentem, todos os dias, o peso da invisibilidade e da exclusão”. O projeto teve a edição de 2025 adiada. A decisão, tomada em comum acordo com toda a equipe participante do processo, foi estratégica. O evento sofreu com baixa adesão de recursos financeiros, o que impactou diretamente em sua realização. “Mais do que uma interrupção, o adiamento reflete a necessidade de mudar a rota, não de desistir. Os organizadores comunicaram que a falta de recursos impede a realização do evento no formato potente e digno que o projeto exige e merece”.

Foto: Reprodução/Instagram

Cultura e Lazer

A falta de apoio para eventos com temática negra afetam diretamente a comunidade, segundo Samuel. Espaços para a comunidade negra que promovem afeto e acolhimento são atos de resistência. “Ao adiar, há um atraso na promoção do empreendedorismo descolonizado, que era o tema central da edição, e na concretização do Eixo 1, que previa uma Feira de Empreendedorismo Negro com culinária afro-brasileira, moda e venda de livros de autores negros. Assim, a interrupção temporária restringe a visibilidade de artistas e empreendedores e pausa o fortalecimento da identidade e o protagonismo da juventude negra nesses espaços”, explica Ferreira.

Foto: Reprodução/Instagram

Além do Afro Potência, ações de Novembro Negro promovidas em Feira de Santana são fundamentais para garantir espaços de protagonismo. Cursando Jornalismo, a estudante Isabela Divino relata a importância de conscientizar sobre as pautas raciais, principalmente para que o futuro dos negros no mundo não seja sobre força e luta, mas que exista a possibilidade de uma vida feliz e com menor quantidade de preocupações.

Para a estudante, é importante não romantizar esse cenário. Não que nos tornemos fracos, mas que sejamos um dia mais humanizados, que possamos parar de romantizar a vida árdua como um mecanismo de contentamento com uma realidade constantemente insalubre”. Nesse cenário, as ações do Novembro Negro refletem esperança e resistência. “É uma oportunidade de dar visibilidade ao povo preto, de mostrar nossa história e celebrar nossa resistência, em memórias dos que se foram e em respeito aos que viram”.

O Novembro Negro é mais que uma campanha, é o momento de afirmar o reconhecimento do povo preto, a força e a história. “No fim das contas, o Novembro Negro é sobre orgulho, memória e consciência. É sobre ocupar espaços que antes não eram pensados para nós e mostrar que estamos aqui, construindo, criando e transformando. É lembrar que faço parte de uma história de resistência, e que, todos os dias, eu também escrevo um pedacinho dela”, relata Josi Santa Barbara.

Mesmo em meio a apagamento histórico e silenciamento social as narrativas raciais continuam, resistem.

“Essa história é silenciada porque não cabe a ela ressoar, essa não é a memória dos vencedores da história, não é a história dos grandes da terra”, relata Nunes. O que, de fato, é feito é manter o resgate da ancestralidade dia após dia, permitindo que a memória dos que já se foram persista e fortaleça quem ainda está aqui. Não é apenas uma campanha, ações e eventos, é a história sendo reafirmada. “E, por fim, é importante dizer que não podemos ser reconhecidos e lembrados apenas em novembro: nossa história, nossas vivências e nossas lutas precisam ser respeitadas e celebradas em todos os meses do ano”, afirma Josi.

Foto: Reprodução/Instagram

Por: Alef Silva, Matheus Gabriel, Tohn Moreira, Tiago Ferreira e Willian Ferreira.

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