Filtros do Instagram e algoritmos que privilegiam corpos inatingíveis distorcem a autoimagem de jovens. Especialistas apontam crescimento de transtornos mentais ligados à insatisfação com a aparência

Quantas vezes você se olhou no espelho hoje e não gostou do que viu? Para milhões de brasileiros, essa insatisfação deixou de ser uma insegurança passageira para virar uma doença. Alimentado pelos algoritmos do TikTok e Instagram, o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) é uma condição onde a pessoa tem uma preocupação excessiva com um defeito imaginário ou trivial na aparência.
Nas redes sociais, a realidade é editada. Luzes perfeitas, poses estratégicas e filtros que afinam narizes ou aumentam músculos criam um padrão de beleza que não existe no mundo real. O problema é que o cérebro humano, bombardeado por essas imagens diariamente, começa a entender aquilo como o “normal”, gerando uma comparação cruel e injusta.
Vigorexia: quando o forte se sente fraco
Um dos desdobramentos mais comuns dessa distorção atinge principalmente o público masculino e frequentadores de academia: a Vigorexia (ou dismorfia muscular). O indivíduo, mesmo sendo forte e musculoso, se enxerga no espelho como pequeno e fraco. Essa visão distorcida é o motor que impulsiona comportamentos de risco.
Para o psicólogo clínico Vinícius Carneiro, o problema central está na perda do referencial de realidade. Segundo o especialista, as redes sociais eliminaram a barreira entre o “humano” e o “editado”.

“O que vemos no consultório hoje é um sofrimento psíquico genuíno causado pela comparação. O paciente compara os seus ‘bastidores’, com todas as suas inseguranças e imperfeições reais, com o ‘palco’ editado de um influenciador. O cérebro não consegue distinguir que aquela imagem passou por filtros e luzes artificiais; ele entende aquilo como um padrão a ser alcançado. Quando a realidade do espelho não bate com a da tela, surge a dismorfia, a ansiedade e a sensação constante de insuficiência”, explica Carneiro.
Para tentar alcançar esse corpo gigante que só existe na sua cabeça, muitos recorrem ao mercado ilegal. Saiba quais são os perigos irreversíveis do uso de anabolizantes e esteroides.
A busca pelo “filtro” na vida real
Fenômeno parecido ocorre com quem busca a magreza. O termo “Snapchat Dysmorphia” (Dismorfia do Snapchat) já é discutido em congressos de cirurgia plástica e psiquiatria. Ele descreve pacientes que levam fotos suas com filtros digitais para os médicos, desejando aquela pele ou formato de rosto na vida real.
A frustração de não conseguir atingir esse padrão digitalmente modificado leva à ansiedade, depressão e à busca desesperada por soluções farmacológicas rápidas, ignorando a saúde. Essa pressa em emagrecer a qualquer custo fez explodir o uso indevido de remédios para diabetes, como o Ozempic. Entenda os riscos graves dessa “febre” do emagrecimento químico.
O algoritmo não tem empatia
Psicólogos alertam que o “detox digital” é parte essencial do tratamento. Enquanto o usuário continuar consumindo conteúdos que reforçam a insatisfação corporal, a cura se torna difícil.
É preciso lembrar: a saúde mental deve vir antes da estética. Se a sua relação com o espelho ou com a comida traz sofrimento, o caminho não é a farmácia ou a academia, mas sim o consultório de um psicólogo ou psiquiatra. O corpo perfeito, antes de tudo, é um corpo com uma mente sã.
Por: Apolo Rocha, Davi Araújo, David Pacheco, Juliana Barbosa e Rafaela Paim